segunda-feira, 14 de julho de 2008

NA ESTRADA

Assim que pisei fundo no acelerador, pingos fortes de chuva se chocaram contra o para brisa do carro que eu dirigia a mais de cem, parecia que eu tinha acelerado a chuva; no rádio Tom Yorker cantava a sua última canção e dentro de mim o incontrolável me guiava. Do céu, o infinito caía. Na estrada, carros em alta velocidade rotineira passavam por mim feito cometas ou asteróides em furtiva agonia e categoricamente ignoravam a minha viagem. Éramos centenas de pessoas numa mesma direção pela estrada que vai de um ponto qualquer aonde se quer, cheios de destinos diferentes se esvaindo no infinito horizonte até perdê-los de vista no espaço insólito do destino de cada um, para nunca mais.
Os automóveis são como cães ferozes avançando sobre o tempo, engolindo as estradas, cortando a fina, extensa e têas estradas, cortando a fina e tpo, engolu no infinito horizonte atntra o para brisa, parecia que eu tinha ACELERADO A CHUVA, Enue linha da vida na pesada estrada de poeira e asfalto, sol e chuva, heróicos motoristas de vida diurna e noturna com seus vôos rasantes em rota de colisão, feito morcegos com seus raros faros e radares salvadores do último minuto antes da morte; pesada estrada de todo dia, guardai-vos de suas esterias, ansiedades e distúrbios do vício, deixai-vos atentos para a curva e para o mundo, vigiai-vos. Dai calma e direção, pois já não são poucos os animais mortos nas estradas, impiedosa estrada de nervos à flor da pele e pista de acesso, de corrida feroz rumo ao minuto seguinte. Dezenas de cães destroçados no assoalho da pista vermelha, como presas fáceis para esses loucos e desvairados animais grotescos e perigosos, automóveis que gritam quando freiam, que urram e vão embora sem piedade ou coração. Outro dia mesmo fui eu quem tive que domar a máquina para não ser mais um algoz e engrossar a lista de óbitos caninos, puxei o gatilho, ops, quero dizer, o volante, abruptamente para a direita, num reflexo salvador voltei para esquerda, e quase me espatifei contra a mureta que divide as pistas, foi por um triz. No retrovisor apenas a lembrança fulgaz do maldito cãozinho me olhando sem entendimento, sai logo da reta criatura insana, o próximo dinossauro pode não lhe ser piedoso, saí logo daí, torci, me distanciando na velocidade da luz. A cena sempre é grotesca, carros avançando sobre eles, abocanhando suas presas sem perdão, destruindo-os, esmagando-os, devorando-lhes as vísceras com vontade, deixando a carniça para os retardatários e urubus. Essas envenenadas e monstruosas máquinas contra criaturinhas tão inocentes que alheias atravessam à sua frente, para nunca mais. Contudo, algumas vezes a briga é outra e o animal de porte bem mais avantajado entra pelo pára-brisa à dentro e destrói junto o seu algoz e ambos sangram e agonizam até à morte inevitável, quando não, instantânea.
Uma abstração da estrada é pensar que seus automóveis que vem e vão, com suas luzes vermelhas e amarelas, congestionam as vias como num fluxo sanguíneo ininterrupto; visto de cima, mais parecem glóbulos vermelhos na corrente sanguínea, dando a percepção de que a estrada está viva, pulsando latejante com suas artérias e veias de asfalto. E dentro dos glóbulos de lata, outros fluxos sanguíneos que se dilatam na mais pura aventura da velocidade atroz dos que vem e vão, num fluxo-refluxo de muitas vidas e de uma estrada que não cessam jamais!

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