segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

A GARÇONETE

A garçonete acanhada e muito tímida, com sua roupa de costume, disfarçada de uniforme, se virava como podia, para atender a “peaozada” suja e tarada no recito em que trabalhava. Desajeitada mas simpática no olhar, sempre acabava esquecendo os pedidos mais recentes e ainda, falava muito pouco. Era meio matuta, apesar de bonita, uma beleza difícil de se ver, com todas essas características predominante. Tinha as ancas avantajadas e me olhava mais que o normal, se apegara a mim por conta talvez de uma brincadeira, acho que a deixei à vontade para ser o que era, dava-lhe bom dia todos os dias e umas piscadelas de vez em quando, que a deixava envaidecida, podia-se notar. Tratava-me melhor que a todos e sempre parecia esperar por mim. Enquanto lavava os pratos, me expiava com o seu sorriso mudo, tal qual moça que tinha chegado à pouco do interior. Coitada, gostaria muito de lhe ser útil, um dia quem sabe! A levaria a lugares fáceis que provavelmente nunca visitara. Ela se deslumbraria, seria presa fácil. Apesar do seu mal jeito, tinha algum jeito, a menina. Quero dizer, era gostosa mesmo, mesmo que não chamndo a atenção. “Merecia um trato!”.
Tomar um sorvete na orla de Copacabana, ir ao cinema, tomar um chopp.
- Ei, menina! Está sujo aqui! E lhe limparia os lábios com os meus dedos safados e a veria tremer com os lábios e com os olhos, num sinal claro de desejo....

A GARÇONETE ( Continuação... )

Depois de três meses de chamego e alguns almoços por conta, ela se daria ao desfrute de cobranças indevidas, roubando a minha paz...
- Eu não te prometi nada, garota!

E ela se sentiria ofendida, só porque se abriu para mim e estivemos em motéis algumas meias dúzias de vezes.
As mulheres trazem e guardam em si, o mistério e o segredo que as mantém além do homem. Acham que têm entre as pernas, tudo o que pode dar a um homem e de fato não estão totalmente erradas. Aquilo que elas e suas mamãezinhas cuidam e guardam com tanto zelo, escraviza e hipnotiza o homem como um cachorrinho farejando a caça, nos doma e nos domina e quando pensamos que estamos por cima, são elas que estão no comando.
A mulher quando é boa na cama, enlouquece o sujeito ao ponto de ele se tornar o seu capacho. Há um outro lado nisso tudo, quero dizer que contudo, elas também não sentem que, ao invés do que pensam(dependendo de como lidam com a situação), entram no caminho da perda do homem que supostamente amam, porque o homem, por mais frouxo que seja, chega uma hora que ele não suporta a submissão, pois a liberdade do homem é mais forte que o tesão que o cega, porque a paixão passa e se não houver amor, benzinho, nada se sustenta. Não há “foda” , principalmente as que já são reincidentes , as que já se deram, que valha aporrinhações diversas e diárias. Portanto, meu nenenzinho, não force a barra, já estou calejado nesta vida. O sexo é bom e muito melhor ainda no início, quando é descoberto, depois é superável.
Ela vai me fazer dizer coisas terríveis sobre a sua existência, ou coisas do tipo, “Não enche minhas bolas!”, “Dá um tempo, benzinho!” ou então me fazer pensar na constatação triste, terrivelmente triste, de que “boceta é muito bom, uma pena que a mulher vem junto!”; e me julgar um crápula e me fazer sentir pior do que sou!
Ela irá se decepcionar de vez, lamentar ter me conhecido e ter me dado assim tão fácil, embora tenha gostado, tanto assim o é, que não me deixa partir. Mas isto também é um outro erro que não se percebe. O sexo e a própria relação em si, às vezes torna-se um vício, uma acomodação sem precedente, que não nos deixa evoluir, que nos manipula e nos mantém presos a um passado ou a um presente que não nos interessa mais. E assim nos tornamos um o inferno do outro. Se tivermos força e alguma coragem, acabamos com tudo, do contrário apodreceremos juntos, estupidamente infelizes.
Ah, benzinho, entenda o que passou. (Seria indigno dizer que o que passou, passou?!)

E eu não mais almoçaria ali, desconfiado, quem sabe, com o que poderia me acontecer, um purgante na bebida, um venenozinho no feijão. O seguro morreu de velho. Vai saber! Melhor é não arriscar!
Será mesmo melhor que tudo fique nesses singelos olhares inofensivos de agora, que no inferno inevitável de depois.

Almocei ali por mais um mês ou dois em intervalos longos de um almoço para o outro, mas nunca tive a oportunidade concreta de viver, para o bem ou para o mau, alguma coisa com aquela pequena adorável, (mas que a comi algumas vezes na punheta, tenha certeza que sim).

- Quanto lhe devo? Perguntei, meio cético.
- Você não me deve nada. Hoje é por conta. Estou indo embora, estou de viagem para minha terra, vou morar com mamãe, de onde eu nunca deveria ter saído - disse-me ela, com uma alegria estranha. Desejou-me boa sorte e foi servir a outro freguês. Não sei por que, mas fiquei com a impressão que havia alguma coisa entre eles. Palitei os dentes, amassei o guardanapo que usei pela segunda vez e o larguei sobre o prato sujo.
Quando ela se virou de volta, eu já não estava mais ali...
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(Parte do novo livro de Nem Queiroz, ainda sem título)

CARTA A MANOEL BANDEIRA - O bicho e o homem


Cuspi no lixo da rua porque o cheiro era insuportável, mas o lixo se mexeu e chamou minha atenção. Pensei que fosse um rato, mas não era; era um cachorro e com ele (o cachorro) havia um homem e ambos cutucavam os sacos de lixo com a mesma fome e concentração, como se disputando os espaços. O homem tangia para longe o animal, mas este voltava sempre persistente e ali continuava firme, da mesma forma que o homem, em busca de algum resto de comida ou coisa que os valhessem.
Há muito tempo atrás, o poeta Manoel Bandeira já falava disso e no poema que escreveu, fora o lixo, havia apenas um elemento, e não era o cachorro. Já naquela época, o homem já se via em tais condições e o poeta se espantava então. Pois hoje lhe digo, meu estimado Bandeira, que o seu espanto continuaria vivo, mais aceso do que nunca, pois que a sociedade e os seus valores só fizeram sucumbir e que o tempo, apesar de outros, não modificou os homens, que continuam os mesmos, piores talvez. E se no seu poema de outrora, o bicho não era um bicho, mas um homem, hoje ambos se misturam ao lixo em que nos transformamos, como se ambos fossem um só.