segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

CARTA A MANOEL BANDEIRA - O bicho e o homem


Cuspi no lixo da rua porque o cheiro era insuportável, mas o lixo se mexeu e chamou minha atenção. Pensei que fosse um rato, mas não era; era um cachorro e com ele (o cachorro) havia um homem e ambos cutucavam os sacos de lixo com a mesma fome e concentração, como se disputando os espaços. O homem tangia para longe o animal, mas este voltava sempre persistente e ali continuava firme, da mesma forma que o homem, em busca de algum resto de comida ou coisa que os valhessem.
Há muito tempo atrás, o poeta Manoel Bandeira já falava disso e no poema que escreveu, fora o lixo, havia apenas um elemento, e não era o cachorro. Já naquela época, o homem já se via em tais condições e o poeta se espantava então. Pois hoje lhe digo, meu estimado Bandeira, que o seu espanto continuaria vivo, mais aceso do que nunca, pois que a sociedade e os seus valores só fizeram sucumbir e que o tempo, apesar de outros, não modificou os homens, que continuam os mesmos, piores talvez. E se no seu poema de outrora, o bicho não era um bicho, mas um homem, hoje ambos se misturam ao lixo em que nos transformamos, como se ambos fossem um só.

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